O que é a Base Nacional Comum Curricular?

Claudia Costin* Orientações para as […]

20 de fevereiro de 2019

Claudia Costin*

Orientações para as famílias

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento que define o que de mais importante os alunos de todo o país devem aprender durante a Educação Básica, ou seja, da Educação Infantil até o final do Ensino Médio. Essas aprendizagens essenciais serão importantes para a formação de currículos municipais e estaduais e nortearão também as propostas pedagógicas das escolas.

A Base define os direitos de aprendizagem e desenvolvimento dos estudantes, aquilo que cada criança, jovem ou adulto anteriormente sem acesso à escola deve aprender – não importa em que região more, se é rico ou pobre, se frequenta escola pública ou particular ou se é do gênero masculino ou feminino. É uma condição para a equidade: garante que conhecimentos, competências e habilidades não sejam privilégios só de quem teve mais sorte na loteria da vida.

Depois, cada Estado detalha as aprendizagens previstas na Base e inclui, de preferência com seus municípios, professores, alunos e famílias, novos saberes mais próprios de seu território e com as peculiaridades da sociedade local. O mesmo ocorre com cada escola, pública ou particular. E, dessa forma, teremos uma única Base Nacional, mas vários currículos.

As famílias têm um documento que lhes orienta sobre o que seus filhos vão aprender na escola e podem, dessa maneira, cobrar dos governantes não apenas que as escolas tenham uma infraestrutura adequada e professores qualificados em todas as salas de aula, mas também que os alunos de fato aprendam o que está previsto na Base e nos currículos. É sabido que os países que contam com boas escolas para todos têm também currículos para garantir aprendizagens que podem ser acessados pelos pais e responsáveis.

Em dezembro de 2017, o Ministério da Educação homologou a parte da BNCC referente à Educação Infantil e ao Ensino Fundamental.

É sobre essas as duas partes que trata este texto. Vamos abordar o que se espera que os bebês e as crianças pequenas aprendam na Educação Infantil e o que os alunos do Ensino Fundamental I (Anos iniciais) têm como direitos de aprendizagem e desenvolvimento.

O que une todas as etapas da Educação Básica, e que está descrito no texto inicial da BNCC, são as dez competências gerais.

“Na BNCC, competência é definida como a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho.”

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília (DF): Ministério da Educação Básica, 2017. p. 8. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>. Acesso em: out. 2018.

As competências gerais definem o que todos os estudantes devem desenvolver ao longo de toda sua escolaridade, numa concepção de formação integral do ser humano. Afinal, a Base não quer transmitir conteúdos para os alunos, mas permitir a eles desenvolver e articular conhecimentos, habilidades, atitudes e valores para que possam participar plenamente da vida, seja no mundo do trabalho ou como cidadãos que se valem do que a Arte e a Cultura lhes proporcionam.

As competências gerais da Educação Básica

A Base Nacional Comum Curricular prevê dez conjuntos integrados de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes, que devem nortear a elaboração dos currículos. Numa linguagem mais direta, resumo aqui cada uma das dez competências:

  1. Valorizar e utilizar conhecimentos sobre o mundo físico, social, cultural e digital e estar pronto para continuar aprendendo ao longo da vida e colaborar para uma sociedade justa, democrática e inclusiva.
  2. Exercitar a curiosidade intelectual e desenvolver pensamento científico e crítico, de forma a resolver problemas e criar soluções inovadoras, inclusive com o uso de tecnologias.
  3. Ser dotado de um repertório cultural e artístico, tanto local como global.
  4. Utilizar diferentes linguagens num processo rico de comunicação em diferentes contextos.
  5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de forma crítica, significativa, reflexiva e ética.
  6. Apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe permitam entender o mundo do trabalho e fazer escolhas com base no seu projeto de vida e em seus sonhos como cidadão.
  7. Argumentar com base em fatos e dados científicos e saber negociar com os outros, numa perspectiva que promova os direitos humanos, a consciência socioambiental e a ética.
  8. Desenvolver o autoconhecimento e o autocuidado.
  9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação.
  10.  Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação de forma ética, democrática, inclusiva, sustentável e solidária.

Espera-se que os jovens apreendam o conhecimento humano produzido ao longo do tempo e que também estejam prontos para articulá-los, mobilizá-los e aplicá-los em diferentes âmbitos.

Um bom começo: a Educação Infantil

Não é simples trabalhar propostas curriculares com bebês e crianças pequenas. Na Primeira Infância aprende-se por meio de exploração do ambiente e de interações com adultos significativos, muitas vezes a mãe e o pai. Aprende-se por experiências e brincadeiras.

Assim, parece estranho pensar em organizar o processo de aprendizagem dos pequenos com etapas ou conteúdos a serem dominados. Na verdade, não se deve mesmo fazê-lo, já que não se trata de definir a forma como conhecimentos se acumulam nesta idade.

A parte da BNCC referente à Educação Infantil está organizado em três grupos de faixa etária assim distribuídos:

  • Creche: bebês (zero a 1 ano e 6 meses) e crianças bem pequenas (1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses).
  • Pré-escola: crianças pequenas (4 anos a 5 anos e 11 meses).

Além disso o documento afirma que devem ser assegurados às crianças os seguintes direitos de aprendizagem e desenvolvimento: conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se.

Considerando esses direitos, a BNCC de Educação Infantil estabelece campos de experiências para que as crianças possam aprender e se devolverem. Assim, a criança aprende de forma lúdica, a partir da organização de atividades e do ambiente. Por isso, a Base define o que é brincar com intencionalidade pedagógica. As brincadeiras precisam ser preparadas para que a criança possa ampliar seu vocabulário, estar imersa em ambiente letrado, aprender a relacionar-se de forma saudável com as outras crianças e adultos e sentir-se bem.

Campos de experiência

  • O eu, o outro e o nós.
  • Corpo, gestos e movimentos.
  • Traços, sons, cores e formas.
  • Escuta, fala, pensamento e imaginação.
  • Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações.

Nesses campos, os diferentes saberes se combinam, tal como estão ligados no mundo real. Assim, a criança pequena aprende sobre palavras e escrita e, ao mesmo tempo, sobre as complexas relações sociais existentes em seu ambiente, desenvolve seu corpo e o seu raciocínio matemático.

Atualmente, várias escolas e municípios estão debruçados sobre esta parte da Base para adequar propostas pedagógicas e currículos. O que os pais podem fazer para apoiar este esforço?

– Participar das discussões na escola sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e sobre a proposta pedagógica a ser adotada.

– Conversar com os filhos, de acordo com a faixa etária, sobre eventuais mudanças no currículo.

– Conscientizar-se de que o principal ator na formação dos filhos continua sendo os pais e que, tanto na escola, como na família, a criança aprende mais com o que os adultos fazem do que com o que eles dizem que deve ser feito.

– Criar um ambiente afetivo em casa, inclusive para que os filhos se sintam à vontade para comentar eventuais frustrações ou sofrimentos, de forma que se possa dialogar na escola sobre temores eventuais e fazer com que a criança se sinta protegida e amada.

– Respeitar os educadores e ensinar os filhos a respeitá-los.

– Ler para seus filhos sempre que possível, ensiná-los a usar livros da biblioteca escolar e criar, dentro dos recursos da família, um acervo de livros para as crianças.

– Perguntar a cada dia à criança o que ela aprendeu ou fez de interessante na escola, comunicando de forma clara o seu interesse pelo aprendizado dela, que pode ser rico e instigante.

Crescendo com a criança: o Ensino Fundamental I (ou Anos iniciais)

A parte da BNCC referente aos Anos iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano) não consiste em um corte abrupto no que se passa na Educação Infantil, já que continua valorizando situações lúdicas, brincadeiras no processo de aprendizagem. No entanto, progressivamente, uma maior sistematização das experiências vividas pela criança começa a aparecer.

No Ensino Fundamental a organização é por áreas do conhecimento, com competências específicas e habilidades a serem desenvolvidas.

O caráter mais complexo do documento nesta parte não permite um detalhamento neste texto curto, mas os pais devem ter claro que deverá haver uma tradução desta parte da Base em currículos das redes públicas de ensino e propostas pedagógicas para cada escola pública e particular. Este processo deverá permitir que os pais entendam o que se espera que seus filhos aprendam e possibilitará que acompanhem mais de perto a vida escolar das crianças.

Há, nesta etapa de escolaridade, atitudes que os pais podem adotar para tornar este processo mais adequado para as crianças, algumas delas já mencionadas na parte referente à Educação Infantil:

– Participar das discussões na escola sobre a BNCC e sobre a proposta pedagógica a ser adotada.

– Conversar com os filhos sobre eventuais mudanças no currículo. Não se intimide com a linguagem da área, que pode eventualmente lhe parecer estranha. Afinal, cada área de atividade humana tende a ter uma linguagem própria.

– Conscientizar-se de que o principal ator na formação dos filhos continua sendo os pais e que, tanto na escola como na família, a criança aprende mais com o que seus pais ou professores fazem do que com o que dizem que deve ser feito.

– Criar um ambiente afetivo em casa, inclusive para que os filhos se sintam à vontade para comentar eventuais frustrações ou sofrimentos, para que possam dialogar na escola temores eventuais; fazer com que a criança se sinta protegida e amada.

– Fazer com que a criança assuma responsabilidades, de acordo com a faixa etária, por suas condutas. Estabelecer limites com amor não estraga a criança.

– Atuar com firmeza se pressentir que a criança está sendo vítima ou mesmo cometendo bullying real ou virtual. É importante também ensinar empatia aos filhos e ser assertivo caso, sozinhos ou em grupo, humilhem algum colega.

– Conversar com as crianças sobre os valores apontados nas competências gerais da BNCC, especialmente sobre aqueles que envolvem seu projeto de vida e seus sonhos de futuro. É importante que desde cedo elas se conscientizem que são empreendedoras de suas próprias vidas e que o que aprendem na escola é instrumental para isso.

– Respeitar os professores e outros funcionários da escola e ensinar os filhos a respeitá-los, mesmo quando discorda deles.

– Ler para seus filhos sempre que possível, ensiná-los a usar livros da biblioteca escolar e criar, dentro dos recursos da família, um acervo de livros para as crianças.

– Perguntar a cada dia à criança o que ela aprendeu ou fez de interessante na escola, comunicando de forma clara o seu interesse pelo aprendizado dela, que pode ser rico e instigante.

A Base vai levar algum tempo para ser implementada de forma plena, mesmo depois de os currículos e as propostas pedagógicas serem estruturados. Isso porque materiais de apoio e capacitação precisarão ser oferecidos aos professores e isso não se faz do dia para a noite.

Acompanhe o processo na escola de seu filho e na cidade em que vive. Definir uma base que estipula o que todos precisam aprender é o que fizeram os países com bons sistemas educacionais e este é o primeiro passo de um caminho para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária (menos desigual).

*Diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (Ceipe-FGV) e professora visitante da Faculdade de Educação da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. Foi diretora global de Educação do Banco Mundial, secretária municipal de Educação do Rio de Janeiro, ministra da Administração e secretária de Estado da Cultura do governo do Estado de São Paulo. Integra a Comissão Global sobre o Futuro do Trabalho da Organização Internacional do Trabalho (OIT), das Nações Unidas.